terça-feira, fevereiro 03, 2015

O PT é o maior culpado pela eleição de Eduardo Cunha; quem mandou ignorar os movimentos sociais?


O peemedebista Eduardo Cungha durante sua posse como presidente da Câmara.O peemedebista Eduardo Cungha durante sua posse como presidente da Câmara.
Grande derrotado na eleição em primeiro turno do novo presidente da Câmara dos Deputados, oPartido dos Trabalhadores precisa olhar para o espelho e, em vez de ver ali a vítima, reconhecer o principal culpado –ele mesmo.
Não poderia haver representante mais adequado a uma Câmara dos Deputados apequenada por interesses mesquinhos, e a serviço de mega-financiadores de campanha, do que o negocista Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o eleito.
Mas ele é a consequência natural da tal governabilidade a todo custo, defendida com unhas e dentes pelo alto comando petista. E que levou o partido nascido das lutas operárias e estudantis dos anos 1970 e 1980 a um distanciamento sem precedentes dos movimentos sociais.
É que, para não desagradar aliados ruralistas, o PT rifou a luta pela Reforma Agrária e pela demarcação das terras indígenas; para não melindrar a bancada evangélica, o partido colocou em banho-maria a criminalização da homo e da transfobia (Dilma só se lembrou disso na campanha do segundo turno). Descriminalização do aborto, lei de drogas, desmilitarização das Polícias Militares, reforma urbana… o PT fugiu de todas essas raias, abandonando os movimentos sociais à própria sorte, enquanto colocava todas as suas fichas nas articulações com os caciques partidários.
A descaracterização a que o PT se obrigou em nome da governabilidade levou o partido, que já encarnou os melhores sonhos da juventude, a esgotar seu capital simbólico de agente transformador progressista. Confundiu-se com os “300 picaretas” que já denunciou.
Logo depois de abertas as urnas no ano passado, dizia-se que o país elegera o congresso mais conservador desde o fim da Ditadura Militar. Como poderia ser diferente, se o principal partido de esquerda havia baixado suas bandeiras históricas e colocado todas as fichas para eleger oportunistas, como o ex-presidente do Corinthians Andrés Sanchez?
A direita ganhou a maioria da Câmara por W.O.


O PT não apareceu para jogar ou chegou atrasado.
Eduardo Cunha, o presidente da Câmara dos Deputados agora eleito, é produto dessa infeliz safra, uma caricatura de político conservador com viés de fundamentalista religioso. Denúncias de corrupção contra ele há aos magotes, desde que foi presidente da Telerj, a companhia telefônica do Rio de Janeiro, ainda no governo de Fernando Collor.
Em 2010, debochado, apresentou o projeto de criminalização da “heterofobia” e de criação do “Dia do Orgulho Hétero”. Como se os heterossexuais fossem atacados e assassinados como acontece diariamente com gays, lésbicas e transgêneros… Escárnio.
Também é autor de projeto de lei que prevê pena de 6 a 20 anos para médico que realiza aborto, além da cassação do registro profissional. “Estamos sob ataque dos gays, abortistas e maconheiros”, fantasiou.
Para atrair as simpatias dos grandes grupos de comunicação, Cunha declarou-se contrário a qualquer forma de regulamentação da mídia. Para brecar a reforma política, defende —cara-de-pau— o financiamento privado de campanha.
Pudera! Em 2010, ele recebeu R$ 4,76 milhões para fazer sua campanha, dos quais R$ 500 mil vieram da empreiteira Camargo Corrêa; outros R$ 500 mil da Usina Naviraí de Açúcar e Álcool.
Em 2014, Cunha prosperou. Seu comitê de campanha embolsou R$ 6,83 milhões de empresas como oShopping Iguatemi, Bradesco, Líder Táxi Aéreo, Santander, BTG Pactual, entre outros.
Os jornais já se assanham em prognosticar os próximos passos do minueto sinistro. O PT, que já entregou os anéis, dará dedos, mãos e pés, em prol da governabilidade, já que Eduardo Cunha, como presidente da Câmara, apossou-se das chaves para abrir um eventual processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff (com ou sem motivo).
Mas dar os anéis, dedos, mãos e pés significa descaracterizar ainda mais o partido, mesclá-lo totalmente ao lixo político que a juventude rejeita e que presta um desserviço às causas da igualdade e da liberdade.
Um outro rumo é possível, as ruas estão mostrando, mas exige a coragem que a direção do partido parece ter perdido. Coragem de tentar restabelecer o contato com sindicalistas, ativistas sociais, sem-terra, juventude, movimentos de mulheres, de direitos humanos, lideranças indígenas, sem-teto. Porque, se a Câmara foi para o brejo, o país não foi. Ainda.
Só para lembrar, uma Igreja Católica desmoralizada pela intolerância com o mundo moderno, peloshábitos ostentatórios, por uma saraivada de escândalos de corrupção e pedofilia, pelodesânimo dos fiéis acossados pelo avanço neopentecostal, mostrou-se capaz de reação, ao contrariar a Cúria Romana e eleger o papa Francisco, depois da renúncia de Bento 16.
Com seus 2.000 anos de sabedoria e sobrevivência política, a Igreja Católica sabe que às vezes é preciso mudar, ainda que seja um pouco, para não perecer.

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